Resignação nua e violenta

Resignação nua e violenta: setembro 2004

segunda-feira, setembro 27, 2004

Amor ou Luxúria

Corroendo a minha alma, desfaleceu,
Como um fósforo que vive no fogo,
Fumei-a, e sinto-a queimar os meus pulmões,
Enchendo-os com desejos e pecados perpétuos.
Dissolvi-a com o meu respirar,
Ardendo num som murmurante,
Flutua em meu redor com um ar implacável.
Apagando os meus sentimentos.
Rodopiou-me em redemoinhos amargos,
Dissolvendo-se no lago da alma.
Eras ninfa, agora passado,
Demónio que me queima sem falar.
Sou artigo exposto para consumo da casa,
Caixa de fósforos suicida, peregrino do cigarro.
Dói-me sempre que te acendo
Dói-me sempre que te apago.

domingo, setembro 26, 2004

Espada do Tempo

No peito carrega-se o altar,
Uma lamina presa num fio banal.

A dor ardente nos braços,
Pára as lágrimas espelhadas.
A casca sacrificada acalma as dúvidas,
E ajuda a apagar os medos.
Ânsia de sentir, dor mais uma vez,
Em mundos de loucos e excêntricos.
A ânsia de sentir a tranquilidade,
Da faca perdoando, num toque tenro.
A cólera é às vezes tão forte,
Que a dor torna-se ofuscante.
Enquanto se assiste ao brotar do sangue,
A sanidade plana.


quinta-feira, setembro 23, 2004

Fase da vida

Ela construiu muros
De granito à sua volta

Evitando a confrontação,
Reforçou o seu castelo,
Fazendo fachadas mais fortes.
Cada palavra abrasiva que suportou
Construiu outra camada.

Atrás do muro,
Nesse campo de concentração
De câmaras de gás abstractas.
O seu rosto transparente parecia petrificado.

Um sorriso morno ou comprimentos falharam
Em descongelar a imensidão gélida dentro dela.
Dentro da chaleira ao lume,
A água evapora
Num som ancestral
Anunciando a próxima paragem.

A expressão áspera dela
Era destituída de sentimento.
Ela não podia conferir amor
Ou recebe-lo.
As ondas tumultuosas embateram
Contra as paredes (mas o esforço foi em vão).
Mil arco-íris corromperam
O pôr-do-sol infectado.

Sem vacilar, ela espreitou por baixo da torre.
A espuma branca saltou mais alto,
Mas ela estava sempre um passo à frente.
Só a determinação inexorável
E o amor sem retorno

Entraram, abrindo o portão de ferro.
Com um coração lânguido,
Intencionalmente amarrou amores e
Atirou-os do precipício
Para o sombrio, mar frigido.

Afogando-os …
Os Romeus foram levados pela corrente,
Para longe dos seus sentimentos.

quarta-feira, setembro 15, 2004

Quarto 313

Bêbado e estranho,
Já despido no quarto 313
Ouvi ruídos perturbadores
Vindos do quarto ao lado.
Quis observar pela fechadura
(Lacónico impulso psicológico
De um sujeito sem nada a deixar).
Vi almofadas macias
Num chão duro de madeira,
Iluminado por velas.
Sobre a luz chamejante,
Consegui vislumbrar
Peitos confrontados em silhueta,
De duas crianças perdidas no tempo.
Braços acariciando uma mulher,
Assinalados por algemas baratas.
Uma brisa fresca entoou
Nas cortinas como velas ondulando.
A luz sobressaltou
Criando um ambiente excêntrico
Ao redor dos corpos.
No meio de beijos lentos e macios,
Ele molhou os lábios
Num copo de vinho,
E a língua tocou no lábio inferior dela,
A boca dela abriu-se
Em gritos tresloucados,
O seu corpo contraía-se ritmicamente.
Enquanto se masturbou lentamente nessa noite.
Eu fui-me deitar desusado...
Bruscamente,
Acordei um tanto confuso
Com o violento bater nas paredes,
E os gritos ordinários.
Afinal de contas,
Para quem tinha gostado bastante do gritar,
Os meu ressonar,
Deixou-os perturbados.

domingo, setembro 05, 2004

Ponto da loucura

Seis e meia
Tempo para organizar os pensamentos,
Calando-os na gaveta.
Quero chegar
perto de ti,
Quero o calor dos teus braços
E o santuário dos teus olhos.

Nesta eutanásia afectiva
Morremos um dentro do outro.
Cama de cascalho
Onde as serpentes mudam de pele.
Tocaste-me no coração
“Ponto G” da loucura.
Lábios cansados saboreiam
A tua face pela ultima vez.

Vultos despidos,
Corpos desfeitos.

Celebrando o corpo,
Apoias-te em mim
Tentas alcançar o cigarro
acesso
Na mesa-de-cabeceira,
Pausas para tocar o meu rosto.
(Uma reflexão tardia, realmente -
Um cigarro está primeiro na mente)

Na quietude da essência
Da chama da distracção
Eu vejo a tua face
Ternamente alinhada
Com anos de vida e amor.

Talvez, algum dia eu também
Serei escrito na tua face
E outra pessoa a irá ler
E me compreenderá.