Resignação nua e violenta

Resignação nua e violenta: novembro 2009

domingo, novembro 29, 2009

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Apanho o eléctrico, dirigo-me para o centro
O cansaço dos corpos pede por um recanto
Sussurro imagens à tua pele ao teu ouvido
E encostas a nuca no fundo do meu ombro
(Incorporamo-nos num abraço terno e dengoso)
No meio de tanta gente tornamo-nos fugazes
Fechamos os olhos no leito dos nebulosos passageiros
Entre sonho e realidade somos sonâmbulos
Abrimos e fechamos o olhar, requebrados de sono e prazer
Humedecemos entre nós o tal delicado querer
(Inebria de dois corpos que se enroscam)
Despertamos com vorazes passadas na trilha do transporte
Ele encontra-se vazio, nós porém tão loucos e atestados
Consumidos num sonho uno de renascer tranquilo
Saímos do eléctrico inflamados por deleites e vontades
Apertamos as mãos e incorporamo-nos outra vez
Abandonamos um sonho para ver outro acontecer

A Missa

Uma da manhã, só quero partir para longe.
Tomo um duche quente para tirar o cheiro.
Meto-me nojo, salto na ponte da consciência.
(Liberto -me sem escrever tudo o que sei)
Mas não morro ó meu brilho ilusionista!
Escrevo memórias que vivem no meu medo,
Formas escuras que procuram os teus seios,
Desde o crítico ao Joseph Beuys, sim eu sei.
Cáusticas amizades próximas neste afecto!
Passeio os dedos no teclado da mente,
A pele molhada do banho oferece-me choques,
Dores de prazer matam-me sem querer!
Tenho que limpar o que resta dessa aparência.
Um poeta so escreve quando é confrontado:
Uma, ou pelo mascimento ou pela morte.
Será possivel eu escrever sobre as duas?
Choro pela coisa mais linda desta vida
Contudo sempre pedi este truque de magia,
Mas nunca soube bem como era praticável.
Pensava que só uma mãe conseguia decifrar!
(Virtude que não prezais pois sabe demais).
Hoje mergulho e lavo, sou meio-homem não tolo
Sei desvendar um truque de réplicas a prazo.
Contorço num arrepio para aquecer o corpo
Suprimindo os abismos criados dentro de mim
Sei que sempre serei teu, mesmo sendo infeliz
Não sei o que é dormir, longe também não sou feliz
Amar-te-ei para sempre
(Acredita que só no teu amor exponho a minha solidão)
Respiro, reavivo-me e rodo a chave num voto confiança
Fui consagrado no mais puro perdão e aguardo
Com um corpo frio por um actos e beijos seus
E pela perpetuidade que em vós permanece.

sexta-feira, novembro 27, 2009

A árvore de Sofia

A arte presta testemunho,

Nesta viagem, uma árvore foi plantada.


Creio que no acto de criação o artista é depositário.

Transporta os vários mistérios da fecundidade,

Memórias impessoais de âmbito colectivo

Onde o mais difícil é sempre o mais simples.


Perceberam-se as falsas seguranças do autor,

Houve um confronto com o desconhecido

E tornou-se claro plantar um lugar de segurança,

Gerar vida no deserto impetuoso de uma ilha

(Aceitou-se a morte, intensificou-se a vida),

Rivalizando por certo com o dono da criação.


O mistério desta transmissão perante a vida

Transporta em si um enigma, um cofre de mistério.

Na solidão da terra abre-se a vasta maternidade

(O ser que tenta num vulcão e numa redoma)

E o criador-artista é mediador esse desconhecido

De destino interior, avançou-se num fado fixo.


Oferece-se aquilo que sempre esteve ali

Porém deixa-se por abrir o que é de revelar.

Não é preciso ser budista para abrir novas realidades.

(Dentro do ser nascem o espaços e distâncias)

Estes castelos endógenos são criação da eternidade

Beleza tão pura porém tão pobre e indigente


Brota da terra uma harmonia que deixa meditar

Nesta acção recolhemo-nos em longos silêncios,

Associamo-nos ao sublime do eterno.

Pretende-se que o nativo a atravesse e aceite

Sem o olhar da criança que não entende o mundo

Mas na criação de um sistema, gestos e instantes.

A arte está no modo como escolhemos viver.


Plantou-se atenção para os de lá cuidarem e amarem.

Mas após o acto materno praticado em segredo,

No artista pára a memória de uma tristeza laboriosa.

Que apenas Deus sabia que vivia (isso e os pecados)

Pensou na punição mas concedeu certos milagres

Pois em casa havia quem amava e perdoava a ofensa.


Nesta viagem percebe-se que arte é dar o seu melhor,

E não há melhor dedicação que a Vida,

Pois, nas horas de cansaço continua a haver vento,

E se virmos, a divindade é feita pelos actos dos homens.

É este frutificar, algo belo que começa a nascer

Num confronto entre a alma humana e a natureza.


No crepitar da ilha deu-se sorrisos em terrenos estéreis.

O florir pouco importa mas será recompensante,

Nobre teimosia do acreditar no acto divino praticado,

Como uma crença no futuro ou completude da criação.

Naquela ilha transmitiu-se a imortalidade da vida,

Numa árvore bela e dolorosa de uma gestação sublime.

domingo, novembro 22, 2009

Renda Preta

Deflagro-me
Provoco excitações no embate do teu corpo,
Exaltações de prazer ou louvor que não cessam.
Não consigo parar este choque profundo do homem,
Que me cega a razão e me torna desejo e animal
(Sublime elevação da carne e do espírito).


Desafias-me
Provocas voltar a ter a ânsia que tens quando te tratas
(Belo corpo lavado que treme entre os seus azulejos).
Falamos conceitos num acto perverso de afecto.
Rasgamos num impacto molhado e metamorfoseamo-nos,
Unidos pelo ardor e pelo prazer dos gemidos e palavras.


Dominamo-nos
Loucuras de dois, chicoteiam-se num sublime acto único
(Mãos roídas que me apertam o quadril e rasgam).
Exaltas impulsos que agito dentro do teu ser,
Fervemos loucuras, movimento-me na ebulição,

Choramos e rimos não-palavras que são desejos!


Silêncio!
Embalados, num aperto amparamo-nos unidos.
Abrigas-te segura no abraço mais aconchegante da tua vida
(Selando quem mais te protege no leito da tua alma).

Pois entendes que é possível sustentar adversidades

Na protecção do mais intenso coração que te adora!


quarta-feira, novembro 18, 2009

A origem do salto

Olhando para vocês, diriam que sou poeta.

Aspirando em silêncio cada suspiro meu,

Perversos, escutam as minhas expansões.


Talvez já não me lembre, sou rua deserta,

Sombra de um piquenique calado e triste,

Duvido da minha origem, se foi uma morte.


Pedras de calçada queimam por lampiões.

Sinto presa na escuridão a tal melancolia,

Talvez de um anjo que alguém despertou.


Larguei as asas em prol da tua felicidade,

Murmurei imagens no teu cabelo escuro.

Tornei real, o sonho remoto de uma menina.


Como um bom vinho num copo só teu,

Numa cidade que só de ti tenho como bela.

Ó musa sombria que avivas as palavras em mim.


Caí do céu no pranto amargo da tua oração,

Toque que porta que reconheci como: é este!

Plantaste a semente de uma fadada sacra flor.